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A mudança de postura como principal legado e algumas reflexões sobre a Copa do Mundo para o Brasil – a partir de uma visão empírica (parte 1)

Ricardo André Richter 8 de janeiro de 2014

Desde que o Brasil foi oficializado pela FIFA em 30 de outubro de 2007, como sede da fase final da vigésima edição da Copa do Mundo de Futebol, muitos brasileiros começaram a se questionar se o país teria mais a ganhar do que a perder como anfitrião do maior (economicamente e pelo número de espectadores) evento esportivo do mundo.

Seria o Brasil capaz de fazer seu dever de casa, com empenho e disciplina, com transparência e pontualidade? Seria esta grande oportunidade usada para uma quebra de paradigma e de estereótipos, como de que o Brasil se consolidou como a 5ª. ou 6ª. maior economia do mundo apenas pela sua dimensão continental infestado de riquezas naturais e de que o brasileiro vive uma eterna rotina de carnaval, praia, futebol e principalmente de “jeitinhos”? Seriam os governantes, dirigentes de clubes e empresários envolvidos nas obras de infraestrutura todos honestos e/ou intimidados pela grande atenção dada pela imprensa nacional e internacional? Seriam as inúmeras obras de melhoria em infraestrutura de mobilidade e de turismo os maiores legados para a população? A promessa da isenção de dinheiro público nas construções de novas arenas seria mantida?

O objetivo deste texto não é de ser mais um de tantos que circulam por aí se beneficiando da visibilidade que o esporte mais popular do Brasil e do mundo oferece, para criticar decisões institucionais (FIFA e governo brasileiro) e criticar questões sociais, políticas, culturais, econômicas, etc. É muito fácil criticar, apontar o dedo, fazer barulho analisando o que deu errado ou não está bom. Às vezes, tenho lido ou ouvido pessoas criticando a preparação, a organização e as decisões tomadas por seres humanos incumbidos de fazerem o melhor, com argumentos completamente descontextualizados, incoerentes e até injustos. Em determinados momentos tenho a impressão que há pessoas sob o efeito da massa, mas o efeito negativo da massa, no sentido de “se tem tantas pessoas criticando e falando mal da Copa eu também vou falar mal”, “se tem tanta gente jogando pedra, deixa eu também jogar uma pedrinha, não vai fazer tanta diferença para aquele que é o alvo”, muitas críticas feitas sem responsabilidade, sem preocupação em ter uma dimensão real da situação. Não podemos entrar cada vez mais nesta corrente negativista, cheia de teorias da conspiração, se no dia a dia adotamos uma postura de alguém que está concentrado em criticar e não em pensar positivo, construtivo, agregador, ativo, integrante de uma engrenagem maior que só funcionará bem se cada peça funcionar construtivamente. Pensando nisso, que resolvi abordar o outro lado, o lado bom de termos a Copa do Mundo no Brasil em 2014. Estou ciente, de inúmeros erros e falhas das duas principais instituições organizadoras do maior evento do futebol mundial e tenho minhas próprias convicções sobre o que deveria e/ou poderia ter sido planejado de outra forma, com outras estratégias e por diferentes caminhos durante a preparação da Copa. No entanto, neste texto irei me esforçar principalmente em discutir o que ainda será e poderá ser feito de positivo, as possibilidades que já existem e ainda surgirão, os legados que ficarão e a postura dos brasileiros, que acredito que já está mudando e que ainda poderá continuar a mudar de acordo com o que cada um vislumbrar com a Copa.

A Copa das Confederações FIFA, realizada como “evento-teste” um ano antes do mundial, foi importante para demonstrar falhas, acertos e oportunidades em diferentes setores da organização e do governo. Apesar de dar uma prévia do evento principal, a Copa das Confederações tem uma dimensão muito menor, contando com apenas 8 seleções participantes, 6 estádios, duração de 15 dias e recebendo aproximadamente 40 mil torcedores VIPs ao longo do torneio. Enquanto isso o mundial contará com a presença de 32 seleções nacionais, com jogos em 12 estádios, duração de 31 dias e cerca de 400 mil torcedores VIPs.

Abertura da Copa das Confederações aconteceu no Estádio Nacional de Brasília. Foto: Mowa Press.

Entre as principais falhas até o momento está a construção de estádios com verbas públicas ou generosos incentivos financeiros do poder público. Destaco principalmente os estádios de Brasília e São Paulo. No caso do estádio Mané Garrincha, em 2010 fora orçado em aproximadamente R$ 700 milhões, no entanto, devido a uma série de problemas com atrasos, mau planejamento, erros de cálculo, etc, os investimentos chegaram a incríveis R$ 1,778 bilhão (segundo o relatório do Tribunal de Contas do Distrito Federal de junho de 2013). Em junho de 2013 estive por duas semanas diariamente no estádio e tive a oportunidade de conhecê-lo como poucos e ao compará-lo com a Allianz Arena de Munique (ambos com cerca de 72.000 lugares), uma das mais modernas arenas europeias, percebe-se nitidamente a superioridade nos acabamentos do segundo, construído por 340 milhões de euros entre 2002 e 2005 (aproximadamente R$ 1,080 bilhão). Além disso, a arena construída em Brasília é uma das maiores arenas de futebol que existem no mundo, principalmente no que se refere à área de infraestrutura de apoio, que fica no subsolo ao redor do gramado. Apresenta-se aí um segundo erro estratégico do governo brasileiro na mesma sede, ou seja, além do dinheiro investido ser público colocou a segunda maior arena do Brasil e uma das maiores do Mundo numa cidade sem expressão no futebol profissional brasileiro. Uma Arena com capacidade de 42 mil pessoas teria sido uma decisão no mínimo mais sensata para esta sede da Copa e facilitaria em muito sua manutenção.

Entre incentivos fiscais e financiamentos do BNDES (através do Programa de financiamento Pro-Copa Arenas) a juros especiais a Arena de Itaquera, São Paulo, escolhida para sediar também o jogo de abertura, é um estádio pertencente ao Sport Club Corinthians Paulista que também teve financiamento público, num valor total que deve ultrapassar os R$ 900 milhões. Os financiamentos do Programa do BNDES Pro-Copa Arenas deverá chegar a aproximadamente R$ 4 bilhões. Enquanto isso, a cidade de São Paulo teria dois estádios (Morumbi/SPFC e Allianz Parque/SCPalmeiras) que poderiam receber os jogos da Copa. Além disso, a região, na qual a Arena da Copa foi construída apresenta significativa vulnerabilidade social e um sistema de acesso bastante limitado.

Em relação às obras de infraestrutura destaco como uma das principais falhas a demora na definição das estratégias para a solução dos históricos e crescentes problemas nos maiores aeroportos brasileiros. Apenas no ano da Copa das Confederações que se realizou a privatização do aeroporto de Guarulhos, o maior do Brasil e principal entrada das delegações, jornalistas e turistas no Brasil em 2014. Durante a Copa do Mundo de 2006 na Alemanha as distâncias mais longas entre uma cidade sede e outra eram de 800Km, que ofereciam diferentes opções de transporte como aéreo, ferroviário (ICE, mais de 200km/h) e rodoviário (com autoestradas em excelente estado de conservação, podendo ser utilizado o ônibus ou um carro alugado), enquanto isso no Brasil, os 4.400 Km entre Manaus e Porto Alegre praticamente inviabilizam outra forma de transporte a não ser o aéreo. As grandes distâncias, as rodovias mal conservadas e os riscos de assaltos nas estradas fazem com que o fluxo de transporte, dos estimados 600 mil estrangeiros e o outro milhão de brasileiros que circularão pelo Brasil durante a Copa, seja realizado principalmente através do sistema aéreo. Ainda em relação às obras de mobilidade, em relação às obras de VLT-Veículos Leves sobre Trilhos em cidades como Brasília, Cuiabá, Rio de Janeiro e Porto Alegre infelizmente não serão concluídas a tempo da abertura da Copa. Alguns dos projetos inclusive tiveram significativa redução ou até exclusão do Programa de obras de mobilidade para a Copa.

Vista aérea das obras de ampliação do aeroporto internacional de Brasília, dezembro de 2013. Foto: Portal da Copa.

As obras na infraestrutura de mobilidade tem relação direta com um crescimento e uma melhora na qualidade do turismo receptivo no país. Pois atualmente, dependendo do horário/data da chegada, um turista estrangeiro precisa enfrentar filas de até 2 horas para retirar sua bagagem no aeroporto de entrada no Brasil, passar mais uma hora na fila do táxi, demorar 3 ou até 4 horas para um trajeto que em condições normais levaria 40 minutos e ainda enfrentar rodovias esburacadas e riscos de assalto antes mesmo de fazer seu primeiro check-in no hotel.

Depois de utilizar o serviço de diferentes hotéis no Rio de Janeiro ao longo de 2013 percebe-se a prática de preços muito acima do mercado nacional e internacional. Como o administrador de um hotel seminovo da categoria quatro estrelas localizado em Belo Horizonte consegue praticar preços abaixo da metade do valor cobrado num hotel da mesma categoria, mas com um aspecto de velho e visivelmente necessitando de reformas na cidade maravilhosa? Valores de hospedagens muito acima dos praticados por hotéis muito bem conservados e modernos da Europa. Recentemente sondei os preços numa pousada bem modesta para o período da Copa, na qual eu já havia me hospedado em dezembro de 2012 e os preços da diária subiram de R$ 120,00 para R$ 500,00. Como não reconhecer uma falha nestes preços praticados por parte dos hotéis, principalmente na nossa cidade maravilhosa?

Em relação ao número de leitos necessários para acomodar os milhares de trabalhadores e turistas que estarão circulando pelo Brasil neste ano, uma das estratégias é agregar os navios cruzeiros como opções de leito. No entanto, para a ampliação da capacidade atual de navios atracados ao longo da costa brasileira, projetos de acessibilidade e de revitalização, como na região do porto no Rio de Janeiro, também estão bastante atrasados.

Vista da cidade maravilhosa, que deverá receber milhares de turistas em 2014. Foto: Portal da Copa.

Criticar sempre é mais fácil do que fazer, é muito mais cômodo e no caso das críticas vinculadas de alguma forma com a Copa, tem-se grande chance em ser aplaudido, porque virou moda criticar a Copa. Mas, como falei dos problemas, das falhas e dos erros estratégicos também trago alguns dos principais acertos que tenho visto e me sinto na obrigação de ajudar a difundir. Desde as obras que saíram do papel até a oportunidade de discutirmos a realidade brasileira em nível internacional.

Muito tem se ouvido o jargão “imagina na Copa!”. Se o trânsito já é um grande problema “imagina na Copa”! Se existe corrupção nas grandes obras envolvendo o poder público “imagina na Copa”! Se há violência nos estádios “imagina na Copa”! Mas convido a todos para uma breve reflexão que vá além do pensamento modista e terciário (porque sempre empurra a culpa para um “terceiro desconhecido”, que hora é o poder público, hora a FIFA, hora a CBF, hora os clubes, hora os grandes empreiteiros, hora o judiciário).

Há pelo menos um ano venho afirmando que o maior legado da Copa do Mundo no Brasil será a mudança no comportamento do brasileiro. Somente por este motivo, somado a alegria do brasileiro em poder receber e participar da maior festa do futebol mundial já terá valido a pena sediar a Copa do Mundo de 2014. Tente imaginar um Brasil sem o futebol? Qual é o assunto que o brasileiro mais fala ao longo da sua vida em sociedade? Existe alguma outra brincadeira que seja mais comum e adorada entre as crianças brasileiras? Qual é o assunto que é capaz de unir o preto com o branco, o rico com o pobre, o velho com o jovem, o urbano com o rural, o sul e o norte a não ser a paixão pelo seu clube de futebol ou pela seleção brasileira de futebol? Qual é um dos poucos assuntos que nos dá alegria e reconhecimento como melhores do mundo ao sermos identificados como brasileiros no exterior? Quantas pessoas próximas a você adoram jogar, assistir, falar, conversar e brincar sobre futebol? Quantos projetos sociais apenas são possíveis devido ao futebol? Quantos empregos existentes fazem uso do futebol? Quantas músicas, livros, filmes, jornais, programas de televisão e rádio, novelas, sites e até emissoras existiram e/ou existem por causa do futebol? Quantos clubes amadores deixariam de existir sem o futebol? Quantos voluntários do futebol perderiam parte do sentido de sua vida se não pudessem mais colaborar para uma vida melhor dos jovens do seu bairro ou da sua comunidade? Quantos jovens ficariam entediados e ainda mais expostos ao uso de entorpecentes e reféns do crime organizado? Quantas crianças e jovens seriam sedentários se literalmente não corressem atrás do seu sonho de ser jogador de futebol?

Em 2014 o “país do futebol” voltará a sediar a maior festa do futebol mundial. Foto: Ricardo André Richter.

A Copa do Mundo no Brasil proporciona a todos os brasileiros a oportunidade de estar no país da Copa e muito próximo dos grandes jogos, dos grandes astros, dos ex-jogadores e personalidades do futebol, se divertir nos eventos que ocorrerão por todo Brasil. Mesmo quem não quiser ou não puder gastar R$ 1,00, terá a oportunidade de se divertir e vivenciar um evento oficial da Copa do Mundo ao lado de pessoas do mundo todo numa das FIFA Fan Fest espalhadas pelo Brasil, em algum evento menor nas praças das cidades ou até mesmo no quintal de sua própria casa ou vizinho.

Vejo a oportunidade e/ou o direito da realização da Copa do Mundo no Brasil como um acontecimento extremamente positivo para o país. A começar pela escolha de 12 e não apenas 10 sedes, sendo que mesmo assim algumas importantes cidades do Brasil como Belém (PA), Goiás (GO) e Florianópolis (SC) acabaram ficando de fora. Nesta decisão, vejo como positivo o fato dos turistas serem convidados a circularem por duas cidades a mais, reduzindo o fluxo contínuo e a sobrecarga da infraestrutura turística e da mobilidade urbana nas demais cidades da Copa, principalmente em São Paulo e Rio de Janeiro. Segundo, todas as regiões brasileiras receberam uma sede. Muitos meios de comunicação internacionais e principalmente dos países classificados para a Copa já possuem equipes de trabalho circulando por TODAS as sedes da Copa, registrando informações e imagens sobre as peculiaridades de cada cidade. Neste sentido, por mais que as cidades de Manaus (AM), Cuiabá (MT) e Brasília (DF) não tenham relevante tradição no futebol profissional acredito que haverá um significativo benefício de marketing turístico para estas regiões. Por exemplo, no último ano acompanhei uma pequena delegação de empresários europeus por Brasília e ficaram vislumbrados com o planejamento, a arquitetura e as obras de Niemeyer e outros na cidade. Estes conheceram a cidade devido a Copa e garantiram retornar à região depois de 2014 para conhecer melhor a cidade, a cultura e passear.

A exposição voluntária gerada pela imprensa internacional tem um valor informativo e turístico infinito para o Brasil, ao mesmo tempo em que reforça estereótipos poderá difundir uma nova imagem do Brasil. Além disso, como muitos grupos da imprensa internacional são também de TV aberta e de jornais diários, o alcance será muito maior por alcançar também a população que não tem acesso aos canais fechados ou às revistas especializadas de viagens, turismo e cultura. Caso estas três regiões tivessem ficado de fora tenho certeza que o discurso seria “o governo brasileiro e a FIFA fazem Copa no Brasil sem a Amazônia, o Pantanal e a capital Brasília”. Em 2010, milhões de brasileiros que nem sabiam que na cidade do Cabo (África do Sul) possuía uma paisagem tão bela com o “Table Mountain” e o mar, receberam estas imagens em casa devido às reportagens sobre o país da Copa. A Alemanha, devido sua grande exposição com a Copa de 2006, até hoje ainda colhe os frutos no turismo e com a imagem de país de ideias e da criatividade que propagou.

Outro ponto positivo são os investimentos dos clubes em modernas arenas. Em 2014 nós teremos pelo menos 15 novas arenas no Brasil, entre reformadas e completamente novas. Será uma nova era para o futebol profissional brasileiro e sul-americano. Com esta nova infraestrutura, novas possibilidades de profissionalização surgirão com a exploração de camarotes, formas de interação entre promotores dos jogos e torcedores, relacionamentos entre clubes e patrocinadores, local de trabalho dos jornalistas, conforto nas arquibancadas, uso e implantação de tecnologias de segurança, novas e mais estratégias na comercialização dos ingressos, mais possibilidades de fidelização de torcedores, etc. Toda a operação dos estádios poderá ser gradativamente informatizada ampliando a eficiência de sua gestão, a transparência e maximizando os lucros para os clubes. Nos casos em que estádios são públicos e geridos por empresas e/ou consórcios privados envolvendo reconhecidas empresas estrangeiras (Minas Arena, Maracanã, Mané Garrincha, Recife), os clubes locatários precisam estar cada vez mais adequando e profissionalizando determinadas áreas da sua gestão administrativa. A presença de empresas da Europa e dos Estados Unidos se estabelecendo no Brasil é muito importante para esta fase de transição de simples estádios de futebol para modernas arenas multiuso. O “know how” que estas tradicionais empresas trazem ao Brasil é fundamental para qualificar e elevar o “status co” e impulsionar as operações das arenas para um standard internacional. Sem a Copa do Mundo e sem os investimentos em novos equipamentos como as arenas, dificilmente este avanço seria possível nos próximos 10 anos. Existindo uma cultura administrativa profissionalizada, estruturada, sólida e transparente será muito mais fácil atrair novos parceiros e investidores.

Se por um lado temos novas arenas e transferência de “know how” estrangeiro é necessário recurso humano capacitado para poder absorver estas novas oportunidades e crescer com elas e solidificá-las. Surgem aí novas áreas no cenário das profissões, entre elas a de gestão esportiva. Fora do Brasil não há poucas universidades que oferecem cursos de graduação e mestrado especificamente em sportmanagement, sportbusiness, publicidade esportiva, gestão de eventos, entre outras, enquanto que no Brasil estas áreas raramente são contempladas com algum curso superior ou especialização. No entanto, tenho percebido grande crescimento na oferta e procura de workshops, seminários e cursos de curta duração nestas áreas. Talvez isto já seja um indício de que em breve a procura e oferta avance para os cursos de ensino técnico, superior e de especialização. Consolidando-se aí mais umas série de novas oportunidades de trabalho, gerando empregos de forma direta e indireta nos mais diversos níveis. Além disso, este novo pool de profissionais poderá profissionalizar a gestão de clubes de médio porte, federações e associações de diferentes modalidades esportivas.

As modernas arenas serão “a faca e o queijo” para uma nova fase na profissionalização esportiva no país. Foto: Portal da Copa – ME.

Ainda sobre o assunto novas arenas e profissionalização gostaria de citar um exemplo que ocorreu no leste alemão, mais precisamente na cidade de Leipzig. A região leste da Alemanha é economicamente muita mais fraca do que as demais e isto se reflete diretamente na representatividade clubística no campeonato alemão. No entanto, em 2005 a cidade de Leipzig foi uma das escolhidas como sede da Copa das confederações e do mundial em 2006, sendo realizados expressivos investimentos públicos para que o antigo estádio fosse transformado numa moderna arena multiuso. Assim como antes da Copa do Mundo o futebol profissional na cidade de aproximadamente 530 mil habitantes, também depois do mundial, teve dificuldades para atrair o número necessário de shows e grandes eventos que permitissem a sustentabilidade da arena. A partir de 2009, a austríaca Red Bull aceitou o convite e se juntou a um clube da cidade com o intuito de levá-lo a segunda ou até a primeira divisão do futebol alemão e manter uma equipe da cidade entre as principais do país, aumentando o número de torcedores e atraindo o público ao estádio. Cito este exemplo ligado à profissionalização do futebol brasileiro, vislumbrando as possibilidades que existem para as cidades brasileiras que tenham grandes e modernas arenas, mas não tenham uma tradição de clubes nas duas principais divisões do campeonato brasileiro, como é o caso das cidades de Manaus (aproximadamente 1,9 milhão de habitantes), Cuiabá (aproximadamente 560 mil habitantes) e Brasília (aproximadamente 2,5 milhões de habitantes).

Outro exemplo também vem do país que passou pela experiência de organizar o evento da Copa do Mundo de 2006, que com esforço coletivo, comprometimento e profissionalismo conseguiu reduzir significativamente as ações violentas de torcedores denominados de “hooligans”. As famílias, crianças, mulheres e idosos voltaram a frequentar os estádios de futebol com a segurança e a alegria que os grandes jogos de futebol merecem. Atualmente a segunda divisão do campeonato alemão possui média de público superior (17.238 pagantes/temporada 2012/13) à média de público do principal campeonato no país do futebol (13.148 pagantes/ano 2012). Com estádios cheios, ingressos vendidos antecipadamente, fidelizando os torcedores, os clubes alemães tiveram um crescimento muito superior a outros países europeus, em relação ao profissionalismo, transparência administrativa, pagamento de salários e honra a seus compromissos. Além da Federação Alemã de Futebol – DFB reestruturar toda sua estrutura de base, com quase 366 centro de treinamento e de formação espalhados por todo país e tornar as academias de futebol de base com garantias de formação escolar e técnico-profissionalizante obrigatórias entre os clubes das duas principais divisões, o desempenho e a eficiência dentro de campo foi uma questão de tempo. Lembrando que a seleção alemã chegou em terceiro lugar em 2006, em segundo em 2010 e para 2014 é uma das principais favoritas, e na última temporada o principal torneio de clubes da Europa foi decidido por dois clubes alemães.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Ludopédio.
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Ricardo André Richter

Doutorando em Educação Física pela Universidade Eberhard-Karls Tubingen. É consultor em Gestão Esportiva e Programas de Qualificação na Europa da ERW Consulting.

Como citar

RICHTER, Ricardo André. A mudança de postura como principal legado e algumas reflexões sobre a Copa do Mundo para o Brasil – a partir de uma visão empírica (parte 1). Ludopédio, São Paulo, v. 55, n. 1, 2014.
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