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Del Río e a Identidade Tanguera de Messi

Gabriel Said 21 de setembro de 2016

O peso de vinte e três anos sem títulos nos ombros, um raro penal mal batido e mais um vice-campeonato foi a receita improvável para fazer de Lionel Messi um argentino, finalmente aclamado e idolatrado por seu povo.

Aquele mesmo Messi que não muito tempo atrás era cotidianamente chamado de extraterrestre viu sua condição de “ser de outro planeta” mudar para “argentino” mais rápido que sua própria ascensão ao topo do mundo.

Seu compatriota Andrés Del Río, professor de Direitos Humanos na Universidade Federal Fluminense, disse em seu texto “Messi e a argentinidade” publicado no blog do Juca Kfouri, que “a paixão argenta pelo futebol é tanguera: o passado sempre é melhor”, e Lionel sempre conviveu com as críticas por não ser Diego. A discussão nunca foi se Messi era o melhor do mundo, mas sim que ele não era Maradona, logo, não era bom o bastante.

Maradona fala o que pensa, jogou pelo Boca, ganhou Copa, fez gols eternos como o da “mano de Díos” contra a Inglaterra que serviu também como uma revanche pelas Malvinas. Maradona já brigou, já quase morreu e tem sua própria igreja.

Já Messi é o garoto que recebeu cuidados diários do Barcelona desde os treze anos. Subiu para os profissionais para jogar com Ronaldinho Gaúcho, é comportado, mais frio, não aparece em sites de fofoca, é tímido e (ainda) não vingou as Malvinas ou fez gol de mão.

Messi entra definitivamente para a bandeira argentina
Messi entra definitivamente para a bandeira argentina

 

Del Río ressalta que no processo para se tornar parte da bandeira argentina, os ídolos são triturados e apenas os sobreviventes farão parte do hino nacional. Nesse processo o ídolo sofre muito, como em um tango. Quando Lio erra o pênalti, perde mais uma final e vai aos prantos, inconsolável e decide ali no calor do momento aposentar a 10 albiceleste virou um perfeito argento. “Porque só um argento processa a vida como um tango” diz Del Río.

O extraterrestre Lionel Messi sofreu, foi triturado e demonstrava suas decepções a cada final perdida. Em 2014 deixou de ser extraterrestre para se tornar humano. No ano seguinte mostrou que era latino-americano ao recusar a medalha de prata a jogando fora, irritado. No dia 26 de junho de 2016 Messi virou argentino e conseguiu a maior conquista pessoal que buscava. Lio não jogava pela Argentina para superar Maradona ou ser campeão, o que ele mais queria era ser reconhecido como argentino pelo seu próprio país e agora, ao ritmo do mais belo tango, a Argentina de Messi tem tudo para voltar a mostrar sua força, afinal sua grandeza se mede em saber dançar o melhor tango.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Ludopédio.
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Gabriel Said

Formado em Sociologia pela Universidade Federal Fluminense (UFF), mestrando em Antropologia pela UFF e aluno da Associação de Treinadores do Futebol Argentino (ATFA). Participa do grupo de estudos de Futebol e Cultura, do LEME/UERJ; do grupo de Futebol e Humanidades da Universidade do Futebol e do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Esporte e Sociedade (NEPESS), da UFF. Além de escrever a coluna Danúbio Azul no Ludopédio, também escreve para a Universidade do Futebol. E-mail: [email protected]

Como citar

SAID, Gabriel. Del Río e a Identidade Tanguera de Messi. Ludopédio, São Paulo, v. 87, n. 9, 2016.
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