Na década de 70, Johan Cruyff já era tido como um dos melhores jogadores do mundo. Conhecido em toda Europa por suas boas atuações e títulos conquistados pelo Amsterdamsche Football Club Ajax, o futebol de Cruyff rapidamente interessou ao FC Barcelona. O clube catalão demonstrou o interesse em contratá-lo ainda em 1969, mas o negócio só viria se concretizar em 1973.
O jogador holandês foi contratado no final de julho de 1973, Cruyff chegou ao FC Barcelona com o status de melhor jogador do mundo, já havia conquistado não apenas títulos nacionais, mas também títulos europeus, como a Liga dos Campeões da Europa, além da Copa Intercontinental. Esse histórico de conquista de títulos fazia de Cruyff o jogador certo para “salvar” o clube catalão. O FC Barcelona não conquistava o título da Liga Espanhola desde 1960.
A imagem do holandês era mundialmente conhecida. Em 1971, havia conquistado o prêmio de melhor jogador do mundo, o prêmio Ballon d’Or oferecido pela revista francesa France Football. Dentro de campo o seu papel foi indispensável para o clube catalão, principalmente no ano de 1974, quando o FC Barcelona ganhou de 5-0 do Real Madrid, no Santiago Bernábeu. No mesmo ano, o Barça ganhou o título da Liga Espanhola após 14 anos na fila.
A identificação com o FC Barcelona foi rápida, em alguns momentos, quando a imprensa anunciava uma vitória do clube trazia ao lado da matéria a foto do jogador holandês. Entretanto, mais que um fenômeno midiático, pode-se diz também que devido a sua importância dentro de campo e o fato de ser o melhor jogador do time, a imagem de Cruyff era de fácil associação com o FC Barcelona, e, por conseguinte com a imagem da Catalunha.
Para além de seu papel em campo, Cruyff se identificou com o clube, e conseguiu associar a sua imagem ao FC Barcelona e a Catalunha. Durante o período que defendeu o FC Barcelona, o jogador holandês deu diversas declarações à imprensa nas quais é possível observar a identificação do holandês com a Catalunha.
Como exemplo dessa aproximação do jogador com a região, temos a escolha do nome de seu filho. Em uma entrevista ao jornal Mundo Deportivo, Cruyff declarou que “Mi proximo hijo llevará nombre catalan […] Jordi o Nuria”1, vale lembrar que estes dois nomes são tipicamente catalães. Um mês depois o jornal, em nota, parabenizava a chegada do terceiro filho de Cruyff. Segundo o Mundo Deportivo, “el hijo del jugador recibirá el nombre de Johan-Jordi, como homenaje a la tierra catalana en la que está vivendo unos momentos de gloria estelar”2 Vale lembrar que, Jordi é o nome do santo padroeiro da Catalunha, e que o FC Barcelona leva em seu escudo da bandeira de Sant Jordi.
Cruyff também escreveu para o mesmo periódico durante a temporada 1973-1974. A maioria do conteúdo das crônicas era voltado para expor o cotidiano do jogador, treinamentos e jogos, além de expressar suas opiniões e expectativas sobre o futebol apresentado pelo FC Barcelona na temporada. Eram raras as crônicas com um cunho crítico ou político, apenas em algumas ocasiões Cruyff se manifestou, ainda que indiretamente, ser favorável a Catalunha.
Em uma de suas colunas, Cruyff reproduziu a frase em catalão que os torcedores do Barça gritavam para incentivar o time: “Visca el Barça!”. Outro exemplo da identificação do jogador holandês com a Catalunha pode ser encontrado em sua coluna escrita no dia 27 de abril de 1974, quando afirmou que “la verdad es que me encuentro tan a gusto em Barcelona, que me siento como un catalán más”3.
Dois anos depois de ter assinado com o FC Barcelona, Cruyff participou de um jogo amistoso servindo a Seleção da Catalunha contra a Seleção da URSS, o placar do jogo foi 1-1, com um gol de Johan Neeskens, jogador do FC Barcelona e também holandês4. O filho de Cruyff, Jordi, além de se profissionalizar pelo FC Barcelona, também defendeu a seleção da Catalunha de 1995 a 2004.
Em 1978, Cruyff deixou o clube catalão com apenas dois títulos, a Liga Espanhola de 1974 e a Copa do Rei da Espanha de 1978. Durante esses seis anos em que o holandês atuou no clube catalão, o FC Barcelona somou mais de 20 mil sócios. Nesse sentido, é possível dizer que a popularização do clube deu-se graças a Cruyff, que aumentou a visibilidade do FC Barcelona, pois era tido o melhor jogador do mundo, além de ter associado a sua imagem ao FC Barcelona e a Catalunha.
Já em 1988, Cruyff voltou ao clube catalão como técnico. O FC Barcelona foi comandado pelo holandês por nove temporadas. Como técnico do Barça, Cruyff conquistou ‑ quatro títulos consecutivos da Liga Espanhola, três títulos da Supercopa da Espanha, uma Copa do Rei, uma Supercopa Europeia e uma Recopa Europeia, todavia, o título mais importante foi a Copa dos Campeões da Europa de 1991-1992, título inédito até então para o FC Barcelona. Devido às grandes conquistas deste período, o Barça ficou conhecido como o “Time dos Sonhos” – o Dream team. Por esse motivo, Cruyff ainda é tido como herói do FC Barcelona.
Em 1996, Cruyff deixou o FC Barcelona, e só voltou a treinar outra equipe em 2009. O holandês assumiu a Seleção da Catalunha, aceitando o convite da Federação Catalã de Futebol. Esses aspectos serviram para reforçar a identificação de Cruyff com a Catalunha. Cruyff comandou a seleção da Catalunha por cinco anos, apenas em jogos amistosos, já que a FIFA não reconhece a seleção daquela região da Espanha. Em janeiro de 2013, Cruyff se despediu da seleção após um jogo amistoso contra a Nigéria, que terminou empatado em 1-1, seguido de homenagens ao técnico. O holandês ainda mora e vive em Barcelona e fala catalão fluente.
A identificação de Cruyff com a Catalunha na década de 1970 pode ser vista como uma forma do jogador se aproximar com a torcida, que era composta majoritariamente por catalães. Essa identificação do holandês com a Catalunha foi rápida, e ampliada com a ajuda da imprensa durante sua passagem como jogador do FC Barcelona. Na década de 1980, quando Cruyff retornou ao FC Barcelona sua imagem com a Catalunha foi reforçada através de suas conquistas. Entretanto, foi nos anos 2000 que Cruyff teve a sua imagem ligada à Catalunha de forma direta. Em suma, durante sua carreira futebolística, Cruyff se identificou com o clube, e teve sua imagem constantemente ligada ao FC Barcelona e a Catalunha, como por exemplo, quando atuou como jogador pela seleção da Catalunha, a escolha de viver em Barcelona, a escolha do nome de seu filho e os anos em que treinou a seleção catalã.
[1] Mundo Deportivo, 23 de janeiro de 1974. p.4.
[2] Mundo Deportivo, 10 de fevereiro de 1974. p.5.
[3] Mundo Deportivo, 27 de abril de 1974. p.36.
[4] Por não ser uma seleção reconhecida pela FIFA, é comum jogadores estrangeiros atuar pela seleção da Catalunha. Além disso, todos os jogos dessa seleção são de caráter amistoso.