No último dia 8 de setembro, foi realizada a final feminina do Aberto de Tênis dos Estados Unidos – um dos quatro torneios que compõem o chamado Grand Slam da modalidade, ao lado do Aberto da Austrália, do Torneio de Roland Garros na França e do Torneio de Wimbledon na Inglaterra.
A disputa do título opunha de um lado a experientíssima e multicampeã norte-americana Serena Williams e, de outro lado, a novata japonesa Naomi Osaka, que surpreendentemente se sagraria campeã por 2 sets a 0. Mas a conquista de Osaka ficaria ofuscada pelas discussões e ofensas dirigidas por Serena ao árbitro de cadeira, o português Carlos Ramos.
No início do segundo set, Serena recebeu instruções de seu treinador – o que é proibido naquele torneio – e foi advertida pelo árbitro. A tenista indignou-se e reagiu com virulência, negando peremptoriamente que tivesse recebido qualquer tipo de orientação. Imagens de TV, porém, mostravam o contrário, e até o próprio treinador assumiu mais tarde que fez gestos no sentido de instruir Serena durante a partida.
Logo em seguida, dando mostras de que estava perturbada emocionalmente, Serena quebrou uma raquete em quadra. Pela reincidência em violar as regras, a norte-americana perdeu um ponto. Em seguida, ela ofendeu Carlos Ramos, chamando-o de ladrão. O árbitro, então, impôs a ela a terceira punição na partida: a perda de um game no segundo set. Naomi Osaka, que assistia incrédula a tudo isso, aproveitou o descontrole da adversária e fechou o jogo.
O episódio é por demais simbólico pela variedade de questões ali envolvidas e por aquilo que distancia o tênis do futebol. Em primeiro lugar: procede a acusação de Serena, de que o árbitro agiu de forma sexista ao lhe infringir as punições apenas por ela ser mulher? Provavelmente não, uma vez que Carlos Ramos também já agiu de forma similar em jogos entre homens, muitos deles tão famosos e vitoriosos quanto Serena, como são os casos de Rafael Nadal, Novak Djokovic e Andy Murray.
Em segundo lugar: por que uma final feminina de Grand Slam não foi arbitrada por uma mulher, em vez de um homem? Ou então, por que não é tão comum ver mulheres arbitrando jogos entre os homens nas finais do Grand Slam? O argumento de que Serena agiu em defesa da igualdade de gênero é louvável – o que não significa, entretanto, que ela não se descontrolaria diante de uma árbitra mulher.
Em terceiro lugar: Serena quis usar o peso de sua história e o fato de atuar em casa para responsabilizar a arbitragem pelo seu insucesso em quadra? Tudo indica que sim. A recente gravidez e a longa recuperação após dar à luz pode estar na origem de ela ter-se mostrado com uma movimentação mais lenta nas quadras do US Open. Serena fez um primeiro set abaixo da crítica, tendo seu serviço quebrado depois de cometer duplas faltas. Parece que a “obrigação” de ganhar mais um torneio de Grand Slam para se tornar a tenista mais top da história ao lado da australiana Margaret Court tem sobrecarregado em demasia as costas de Serena (Court tem 24 títulos em Grand Slams, Serena tem 23).
Por último, temos o árbitro Carlos Ramos. Teria ele exagerado nas punições a uma das maiores lendas do tênis de todos os tempos? Há quem diga que sim – que ele poderia ser mais condescendente por se tratar de uma final de um torneio tão importante. Mas há quem diga que não, uma vez que ele apenas fez valer os regulamentos – algo aliás que o tem notabilizado em sua carreira.
Algumas lições desse episódio nos fazem refletir sobre o papel das regras e regulamentos em competições esportivas de alto nível. Se por um lado parece anacrônica a norma que impede treinadores de passar instruções a suas atletas durante um jogo de tênis, por outro lado não é aceitável vermos uma tenista da importância e do nome de Serena dirigindo-se ao árbitro com o dedo em riste e de maneira acintosa como visto na final do US Open deste ano.
Basta repararmos no vôlei e no basquete, modalidades em que as reclamações contínuas contra a arbitragem são punidas com a perda de pontos ou com a posse de bola para o adversário. Imagine agora o leitor o que seria do futebol se xingamentos ao juiz ou ao bandeirinha revertessem na marcação de um gol para a equipe adversária. É provável que não tivéssemos mais empates por 0 x 0.