98.12

O Maraca não é mais nossa casa

Mariana Vantine de Lara Villela 11 de agosto de 2017

É de partir o coração parar para refletir e chegar a conclusão de que o Maracanã já não desperta aquele ânimo para frequentá-lo. Estamos diante de um exemplo explícito sobre o fiasco deste modelo de “arenização” do estádio, que são as semifinais prestes a acontecer entre Botafogo e Flamengo.

Há não muitos anos atrás, se falassem em um clássico local para definir a vaga para a final da Copa do Brasil, logo viria aquele frio na barriga e a emoção a flor da pele só de pensar no maraca dividido ao meio em uma verdadeira guerra de gritos e cantos. No entanto, assim que definidos os jogos entre Botafogo x Flamengo, percebemos uma nova reação do torcedor.

De um lado, temos o Botafogo com um estádio de uma identidade visual totalmente ligada ao clube, um setor popular atrás do gol com a proposta de ingressos mais baratos, além de planos de sócio torcedor bastante acessíveis.

Do outro, o rubro-negro carioca que tem mandado seus jogos na “Ilha do Urubu”, estádio que segue o padrão da novas arenas de cobrar caro a entrada dos torcedores. Os preços salgados do ingresso têm sido protagonistas nas críticas desta torcida, fato que a faz refletir se seria mesmo a melhor opção mandar seu jogo da semi na Ilha. Mesmo considerando o Maracanã como uma opção, atenta-se ao fato de que o aspecto central de cogitar essa possibilidade é o financeiro para o bolso dos torcedores (ainda assim sem a certeza de que seria realmente mais barato), e não mais o apego sentimental de vibrar em jogo decisivo no maraca.

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A Arena Maracanã e os vazios na arquibancada. Foto: Pedro Martins/Mowa Press.

Não, os alvinegros e rubro negros em sua maioria não preferem jogos de torcida única (que por sinal não irá ocorrer). O que acontece, é a perda da identidade cultural do Maracanã, o qual as torcidas não conseguem mais se identificar e se sentir em casa. A mudança na arquitetura interna, proibição de algumas bandeiras, os inúmeros seguranças tentando controlar o comportamento das pessoas na arquibancada, além é claro de ter se tornado uma arena com alto custo de manutenção jogando o preço dos ingressos para cima, acabaram afastando seus frequentadores. Assim, os outros estádios hoje parecem ser mais acolhedores, inclusive, conforme já falado, é preciso destacar que no Nilton Santos existe um setor atrás do gol no qual os ingressos são vendidos a preços mais populares.

O Maracanã hoje na verdade poderia se chamar “ Arena Maracanã”, como manda o futebol moderno, ou até mesmo “o que sobrou do maracanã”. Ele é um retrato fiel da realidade que o Rio de Janeiro se encontra: um grande balcão de negócios que não deu certo, aonde ninguém quer arcar com o prejuízo e quem acaba pagando o pato é a população. Admitir que o estádio que a gente tanto se orgulha e tem tanta história pra contar já não existe mais é de tristeza profunda, mas não devemos abaixar a cabeça. Recentemente o Liverpool nos mostrou uma ponta de esperança: foi realizada uma pesquisa entre seus torcedores sobre a volta de um setor para torcer de pé, e o resultado foi o que todos nós fãs deste esporte popular esperávamos, mais de 88% a favor. Pensar em uma alternativa para recuperar tudo que de bom foi perdido no nosso futebol é dever de todo apaixonado por esse esporte!

 

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Ludopédio.
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Mariana Vantine

Pesquisadora de Futebol e Políticas Econômicas.Membro do coletivo internacional Football Collective.

Como citar

VILLELA, Mariana Vantine de Lara. O Maraca não é mais nossa casa. Ludopédio, São Paulo, v. 98, n. 12, 2017.
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