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Os altos e baixos do “Dinizismo” no Santos

Pedro Zan 9 de julho de 2021

O dinizismo chegou à Baixada Santista. E chegou em um momento em que, como quase todo ano desde a saída de Neymar, o Santos vivia uma fase no mínimo turbulenta e com a temporada em risco. A situação do Peixe na chegada do novo comandante, após a saída de Ariel Holan, era a seguinte: apenas uma vitória na fase de grupos da Libertadores (além de duas derrotas), uma eliminação na fase de grupos do Paulistão e um catastrófico rebaixamento para a Série A2 no horizonte, caso a equipe não vencesse o São Bento, em casa, na última rodada da competição.

No mesmo dia em que Diniz foi anunciado, os comandados de Marcelo o “Presuntinho” Fernandes fizeram a obrigação e derrotaram a equipe sorocabana por 2 a 0 na Vila Belmiro, assegurando mais um ano da equipe na elite paulista. Diniz viria a estrear dois dias depois, em um jogo da vida ou morte contra o Boca Juniors em casa, antes de, finalmente, contar com uma semana cheia de treinos. E foi um jogo que simboliza bem o que é Fernando Diniz: nunca sem seus altos e baixos.

O Santos venceu o Boca por 1 a 0, gol de Felipe Jonatan. Impossível falar de qualquer influência direta de Diniz no resultado (apenas os relatos dos jogadores de que o gol sai de uma jogada que o treinador ensaiou em seu primeiro treino com a equipe um dia antes), mas sua presença na beira do campo parece ter surtido efeito: um time que antes era apático, frágil, se mostrou uma equipe extremamente competitiva, intensa, sendo “regida” pelos berros do novo comandante na lateral do campo. Jogou bem? Não. Sofreu? Não também. O Peixe bateu de frente com os Xeneizes e seguiu vivo na principal competição de clubes da América do Sul.

Felipe Jonatan comemora o gol da vitória contra o Boca Juniors pela Libertadores da América de 2021. Foto: Ivan Storti/Santos FC.


Contudo, não basta vencer: Diniz tinha que arranjar sua primeira “confusão”. O treinador “enérgico” na beira de campo não demorou para “dar nos nervos” do (péssimo) árbitro uruguaio e do treinador argentino Miguel Ángel Russo. Resultado? Os dois comandantes foram expulsos. Porém, em mais uma das incríveis decisões da Conmebol que parecem favorecer apenas os clubes argentinos, o brasileiro recebeu dois jogos de suspensão, enquanto o argentino pegou apenas um. Com isso, nas duas últimas rodadas da fase de grupos, o Santos seria comandado por Márcio Araújo.

Em duas atuações bem abaixo, pouco intensas e pouco competitivas (faltava alguém gritando “MOVIMENTA!” na orelha do jogador), o Santos foi derrotado por Strongest e Barcelona fora de casa e deu adeus à Libertadores – resultado talvez bem esperado considerando o elenco santista. Por conta do saldo de gols (claro, os bolivianos foram goleados em quase todas as partidas que fizeram fora de seus domínios), o Peixe beliscou pelo menos a vaga na Sul-Americana, para enfrentar mais uma vez o Independiente – não quero nem imaginar o que fará a Conmebol.

Os “altos e baixos” de Diniz mostram bem o que é sua curta passagem até aqui no alvinegro praiano. Com a volta do comandante para a lateral de campo, o Santos venceu jogando mal o Cianorte na estreia pela Copa do Brasil. Nesse meio tempo, a estreia no Brasileirão, em que depois de 45 minutos interessantes contra o Bahia em Salvador, o Peixe sofreu incríveis três gols em 8 minutos da etapa final e voltou para casa goleado. O que daria para tirar desses jogos? Bem, quase nada. Lampejos promissores, falhas individuais decisivas. A incerteza sobre o que seria do trabalho de Fernando Diniz seguia.

A virada veio na segunda rodada do Brasileiro. O Santos venceu (e convenceu) o Ceará por 3 a 1 e emendou uma sequência, no geral, positiva. Em casa, o treinador taxado de “incapaz de montar defesas fortes” assumiu o time que tinha a pior defesa dentre os 20 clubes da Série A no começo da temporada e sofreu apenas um gol em sete jogos, contando confrontos contra Boca, São Paulo e Atlético Mineiro. A verdade é uma só: Diniz acertou o Santos. Encontrou um time base que parece ter encaixado e conseguiu tirar leite de jogadores antes escanteados no elenco, como Luiz Felipe e Jean Mota, que vêm sendo importantes para a equipe. Também contou e contribuiu com a chegada de reforços (o que Holan não teve, vale ressaltar) que se tornaram figuras fundamentais no time, como Marcos Guilherme e Camacho – também escanteados em seus respectivos clubes. Hoje, o Peixe é um time extremamente competitivo, capaz de envolver os adversários e que sabe o momento certo de subir a marcação ou compactar mais, a cara de Fernando Diniz, que rege seus jogadores com seus uivos na beira do campo (único som escutado em um estádio vazio). Mas nem tudo são flores e a “oscilação” dos times do Diniz já está mostrando suas caras no Santos.

A começar pelo fato de que, fora de casa, o Santos sofre bem mais. Depois do atípico 3 a 0 para o Bahia, foi derrotado por Fluminense e América sendo melhor e merecendo a vitória, e arrancou um empate contra o Grêmio após um golaço de Marinho, mesmo fazendo uma partida abaixo. A tendência é o time melhorar ao longo da temporada nas partidas fora de casa, mas parece que a tradicional história do Santos que “só vence na Vila” está voltando. Porém, não é isso que mais preocupa nesse início de trabalho.

Como ficou claro nas partidas contra Juventude e Sport, o Santos de Diniz ainda é incapaz de enfrentar equipes que entrem com uma postura muito retrancada. Nos dois 0 a 0, o time não conseguia furar o bloqueio adversário e se prendia a um excesso de cruzamentos desnecessários e inúteis para a área. Esse problema talvez esteja relacionado às limitações do elenco. De fato, faltam jogadores que sejam capazes de, com uma jogada individual, desestabilizar defesas mais fechadas, mas isso é algo que precisa ser trabalhado pelo treinador. O Santos não pode perder mais pontos em casa contra equipes que brigam contra o rebaixamento, por mais que tenha sofrido pouco defensivamente nessas partidas.

Fernando Diniz
Fernando Diniz, treinador do Santos. Foto: Ivan Storti/Santos FC.

Contudo, a principal crítica até agora sobre o trabalho de Diniz está relacionada a sua “teimosia”. Sem dúvida Camacho é muito mais jogador que Alison, mas com os dois saudáveis, o comandante parece preferir o camisa 5 cuja melhor qualidade são os gritos motivacionais no vestiário (será que isso é motivado pela “identificação” do comandante com o atual capitão?). Pará e Felipe Jonatan vêm sendo os dois piores jogadores do time desde o começo da temporada, falhando constantemente na defesa e não agregando em quase nada no ataque. Independentemente disso, são titulares em todas as rodadas, mesmo com “sombras” no elenco, como Madson e o recém-chegado Onitlasi, o Moraes, que estreou apenas na última rodada contra o América.

Mas o que mais tem incomodado o torcedor santista é a pouca utilização dos jogadores da base. Claro, Diniz bancou Luiz Felipe, que vinha em fase terrível, para o lugar do fenômeno Kaiky na zaga – e deu certo, mas os minutos do zagueiro de 17 anos parecem diminuir. Com a recente confirmação da saída de Luan Peres para o clube do ex-treinador argentino careca, Kaiky chegou a retomar seu posto na última partida, mas não duvido que Danilo Boza, recém-contratado, vença a disputa pela posição. Outro que misteriosamente desapareceu foi Ângelo, o jogador mais jovem a marcar em uma Libertadores da América. Talvez o mais habilidoso e mais capaz de quebrar linhas com dribles desconcertantes no elenco só entrou em campo novamente contra o América, depois de quase um mês sem pisar nos gramados.

Mesmo com a ausência de Marinho na partida contra o Sport, Diniz optou por colocar Lucas Braga no lugar do camisa 11. E com o ataque santista travado, Ângelo foi preterido por – pasmem – Lucas Venuto, o pequeno ponta direito que veio do Canadá em 2019 e que fez no máximo 5 jogos antes de ir para o banco do Sport quase rebaixado ano passado (evidentemente que Venuto foi incapaz de agregar em qualquer coisa na partida). Vale ressaltar também que, com a volta gradual de Sánchez após a grave lesão no joelho, Gabriel Pirani, o jogador de meio de campo mais criativo do time no momento, sai todo o jogo, mesmo em partidas em que Jean Mota não tem sido tão importante. Tudo indica que, quando o uruguaio tiver condições de reassumir (de maneira justa) sua posição de titular e capitão, quem perderá espaço será o meia de 19 anos.

Sem dúvida, Diniz está fazendo o torcedor do Santos sonhar até com uma vaga no G6, o que era impensável até um mês e meio atrás. Com seus gritos exigindo intensidade, movimentação e velocidade, o time antes facilmente vencido por qualquer um hoje controla a maior parte dos jogos que faz. Mas como dito anteriormente, o time ainda precisa melhorar em alguns pontos – e precisa usar um pouco mais a base. O dinizismo na Vila Belmiro até o momento é quase como as ruas da nossa Patos de Minas: com seus altos e baixos, como ser expulso após uma vitória fundamental na Libertadores. Mas pelo menos é um caminho – um caminho que não deixa de ser promissor.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Ludopédio.
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Pedro Zan

Quase formado em Filosofia na Unicamp, mas bom mesmo é falar de futebol. Santista desde sempre, também tenho um podcast, "Os Acréscimos", e sou um dos administradores da página "Antigas Fotos do Futebol Brasileiro".

Como citar

ZAN, Pedro. Os altos e baixos do “Dinizismo” no Santos. Ludopédio, São Paulo, v. 145, n. 15, 2021.
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