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Proposta de reformulação para o calendário nacional do futebol brasileiro

 

O calendário nacional do futebol profissional masculino no Brasil é extremamente desfavorável, seja para equipes nacionais de topo (séries A e B nacional) até equipes de primeira até a última divisão de qualquer um dos 27 campeonatos estaduais. Atletas de clubes grandes sofrem com excesso de jogos, porque realmente vivenciam uma verdadeira maratona física e psicológica. Isso implica em menos tempo para o treinador organizar e corrigir sua equipe entre uma partida e outra. Além disso o tempo também é insuficiente para o atleta descansar e se preparar para poder atuar em um jogo de futebol no seu maior nível físico, técnico, tático e psicológico possível. Com isso a qualidade do espetáculo vendido (jogo de futebol) ao torcedor é menor.

Clubes pequenos em sua maioria sofrem do extremo oposto, a falta de calendário. Pense em um torneio disputado na maioria por atletas que ficam parados (inativos do futebol profissional) quase 9 meses a cada 12 e fazem uma pré-temporada nem sempre ideal. As datas disponíveis para as disputas dos campeonatos estaduais no cronograma das competições do futebol brasileiro em 2015 indicam o início em 1 de fevereiro e o término em 3 de maio. Isso é pouco mais de 3 meses para os clubes que conseguirem chegar as fases finais de seus respectivos torneios.

Sendo assim o que acontece depois com quem não disputa as séries A, B, C e D nacional? Infelizmente não existe calendário para a grande maioria! Os clubes fecham as portas até o ano seguinte! Isso gera um desemprego em massa no segundo semestre de gestores, treinadores, auxiliares, preparadores, jogadores e até mesmo ambulantes. Fato que dificulta e muito a permanência de muitas pessoas no futebol e torna a vida destes profissionais e suas respectivas famílias extremamente instável e insegura. Observa-se que é necessário mudar e tomar atitude, pois a situação é crítica para todos, grandes e pequenos, ricos e pobres! Situações extremas requerem atitudes extremas. A seguir apresenta-se um novo modelo de calendário nacional para o futebol brasileiro.

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Reunião do Comitê de Reformas em 2016. Foto: Rafael Ribeiro/CBF.

Pré-temporada

A pré-temporada seria de 7 de janeiro a 12 de fevereiro (37 ou 38 dias para 57 dos 60 clubes das séries A, B e C, pois quem entrasse na fase preliminar da Libertadores e os dois clubes que disputassem a Super Copa do Brasil teriam uma semana a menos de período preparatório).

Super Copa

O torneio seria disputado em partida única, uma semana antes do início dos Estaduais. Teria prorrogação e pênaltis caso necessário. A Super Copa é disputada em diversos países europeus como Espanha, Itália, Alemanha, Inglaterra entre outros. Esta competição seria a abertura oficial do calendário em nosso país. Reuniria as equipes campeãs do ano anterior do campeonato brasileiro e da copa do Brasil.  Caso o mesmo clube conquista-se a duas competições, o vice-campeão brasileiro seria a outra equipe a disputar a copa. Por ser disputada em jogo único haveria duas possibilidades de local para este evento. Na primeira alternativa o jogo seria na casa do Campeão Brasileiro. Na segunda opção e é a qual me parece ser a mais atrativa, a partida seria realizada fora do país, ou seja, serviria em termos de marketing para expor, divulgar, promover e vender o futebol brasileiro em diferentes partes do globo terrestre, sendo disputada em um país diferente por ano. Em situação hipotética, por exemplo: em 2016 a partida seria no Haiti, em 2017 no Japão, em 2018 no Estados Unidos, em 2019 na Angola. Desta maneira o futebol e as equipes brasileiras conseguiram cada vez mais visibilidade e adeptos em diferentes partes do mundo. Este jogo seria vendido pela CBF aos países interessados e poderia servir para repassar premiações interessantes as duas equipes participantes do torneio. Existiria um intercâmbio maior entre os clubes brasileiros com clubes de outros países. Até mesmo a pré-temporada dos clubes brasileiros envolvidos poderia ser nestes países com 1 ou 2 amistosos contra equipes de reputação local. Imagine o quanto egípcios, japoneses ou árabes pagariam e gerariam de renda ainda na pré-temporada em um amistoso entre o Campeão Brasileiro e o campeão nacional do país em questão.

Campeonato Brasileiro Séries A

O torneio começaria em 17 de março e terminaria até 30 de novembro. 20 equipes disputam o campeonato em pontos corridos, todos contra todos em turno e returno totalizando 38 jogos. Os quatro últimos seriam rebaixados à série B. No mínimo 95% dos jogos seriam aos finais de semana. Em anos de Copa do Mundo haveria o recesso do campeonato brasileiro durante a competição de seleções, sendo assim ocorreria o remanejamento de 4 ou 5 partidas para o meio de semana distribuídas durante o ano para a competição nacional acabar dentro do prazo programado.

Campeonato Brasileiro Séries B

O torneio começaria em 10 de março e terminaria uma semana antes da série A, ou seja, 23 de novembro. 20 equipes disputam o campeonato em pontos corridos, todos contra todos em turno e returno totalizando 38 jogos. Os quatro primeiros ascendem a série A e os quatro últimos seriam rebaixados à série C. Em anos de Copa do Mundo ocorreria o mesmo remanejamento de partidas mencionado na série A.

Conselho técnico da série C foi realizado dia 08 de março de 2016, na sede da CBF, no Rio de Janeiro. Foto: Rafael Ribeiro
Conselho técnico se reúne na sede da CBF, no Rio de Janeiro. Foto: Rafael Ribeiro/CBF.

Campeonato Brasileiro Série C

O torneio começaria em 10 de março e terminaria uma semana antes da série B, ou seja, 16 de novembro. 20 equipes disputam o campeonato em pontos corridos, todos contra todos em turno e returno totalizando 38 jogos. Os quatro primeiros ascendem a série B e os quatro últimos seriam rebaixados à série D.  Em anos de Copa do Mundo ocorreria o mesmo remanejamento de partidas mencionado na série A.

Campeonato Brasileiro Série D

O torneio seria disputado no segundo semestre do ano. Seria necessário se classificar ou obter vaga todos os anos através da série E Regional caso o clube não conquistasse o acesso a série C do ano seguinte. 64 equipes disputariam o torneio em 8 grupos regionalizados de 8 equipes, totalizando 14 jogos dentro do grupo entre turno e returno. Os dois primeiros classificados de cada grupo se classificam para as oitavas. A seguir as 16 equipes classificadas se enfrentam em formato de mata-mata em jogos de ida e volta até chegar ao campeão. Os 4 semifinalistas ascenderiam à série C do ano seguinte.  Os 64 participantes seriam definidos da seguinte maneira: as 6 federações com mais pontos no ranking da CBF teriam direito a 3 vagas cada uma por estado, o restante das federações estaduais do Brasil e o Distrito Federal teriam direito a duas vagas cada, totalizando 54 equipes. Os 4 rebaixados do ano anterior da série C completariam o número de equipes.

Campeonato Brasileiro Série E – Regionalizada

Seriam os Campeonatos estaduais de Primeira Divisão que atualmente conhecemos, porém passariam estes atuais estaduais a não contar com a participação de clubes que estivessem disputando as séries A, B e C Nacional. Atualmente é utópico crer que todos os clubes de todas as federações teriam dinheiro para se manter ativos por todo o ano, porém a duração atual é curta, logo a única regra que começaria a existir é que deverá cada torneio possuir duração mínima de 5 meses de campeonato + 1 mês de pré-temporada até no máximo 9 meses de campeonato + 1 mês de pré-temporada. O regulamento, a data e o formato de disputa ficariam de acordo com a federação estadual. O campeão e vice-campeão de cada uma das 26 federações, mais o Distrito Federal obteriam o direito de disputar o Novo Modelo de Estadual do ano seguinte. Os 6 estados mais bem ranqueados da CBF qualificariam 3 equipes cada, para o Novo Modelo de Estadual e para o Campeonato Brasileiro série D do ano seguinte.

Uma consequência com a saída das equipes de escalão A, B e C Nacional, seria que em alguns estados deveria se reduzir o número de divisões inferiores. Com isso seriam extintas algumas segundas ou terceiras divisões estaduais que existem atualmente, pois equipes de segunda divisão passariam a compor a primeira e de terceira iriam compor a segunda. A ideia é que a Série E nacional tivesse no mínimo 12 e no máximo 20 clubes por estado, isso aumentaria o calendário de todos os clubes.

Para exemplificar: teríamos as séries A, B, C e D Nacional + a série E Nacional Regionalizada. Seriem 27 séries E Regionalizadas, por exemplo: Campeonato Brasileiro Série E Pernambuco, ou Campeonato Brasileiro Série E Santa Catarina, ou Campeonato Brasileiro Série E Rio de Janeiro.

A segunda e terceira divisão estadual de cada federação que as possuísse por ter muitos clubes, se chamariam respectivamente Série E2 Nacional Regionalizada e Série E3 Nacional Regionalizada. Caso alguma federação ainda possuísse uma quarta divisão como é o caso de São Paulo, esta seria chamada de Campeonato Brasileiro Série E4 São Paulo. Sendo assim todos os clubes do Brasil estariam em alguma divisão nacional de A até E1, E2, E3, ou E4 dependendo do estado.

Novo Modelo de Estadual

Começariam dia 13 de fevereiro e obrigatoriamente teriam que acabar no máximo dia 13 de março. Não significa que tem que ter este nome, é apenas para poder entender a ideia do calendário com maior facilidade. Os estaduais não morreriam e agora teriam ainda maior importância. Porém seriam mais curtos, apenas um mês de duração. Cada Campeonato no Novo Modelo seria composto por todas as equipes do estado que estivessem a disputar as séries A, B e C Nacional do ano corrente, mais os 2 ou 3 clubes (dependendo da federação) do estado que conquistaram a vaga através da Série E Nacional Regionalizada no ano anterior. Estados com nenhum representante nas séries A, B e C Nacional decidiriam o título de campeão estadual e a consequente vaga para a Copa do Brasil dentro da própria série E nacional regionalizada.

O formato sugerido para campeonatos de estados com muitas equipes nas séries A, B e C é o torneio estilo mata-mata. Para federações estaduais que tenham poucas equipes a disputar o Novo Modelo de Estadual, estas poderiam criar um torneiro como desejar com até 6 jogos por equipe, a terminar dentro do período acima mencionado. O estilo de torneio da Copa do Mundo com fase de grupos e depois mata-mata também é recomendando. O objetivo é que o campeonato seja de curta duração premiando apenas o campeão com a vaga na Copa do Brasil do ano seguinte.

Copa do Brasil

Disputada 1 de abril até 6 de dezembro. A grande final é disputada em jogo único 5 dias após o término do Campeonato Brasileiro série A. O local da final é na casa da equipe de melhor campanha durante toda a competição. Necessita o total de 9 jogos para ser campeão. Participam apenas os 26 clubes Campeões estaduais do ano anterior, o campeão do distrito federal do ano anterior, e os 5 melhores clubes do campeonato brasileiro série A do ano anterior que não conseguiram classificação através dos seus respectivos estaduais. Caso algum clube brasileiro conquistou no ano anterior a Copa Libertadores ou a Copa Sul-Americana e não conseguiu vaga para a Copa do Brasil através do seu estadual, estes clubes entram no lugar de uma ou de duas das cinco vagas direcionadas aos clubes brasileiros de melhor campanha na série A do ano anterior.

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Sorteio da Copa do Brasil 2016. Foto: Kin Saito/CBF.

Férias

6 de dezembro a 6 de janeiro (32 dias). Quem não se classificasse para a final da Copa do Brasil teria 37 dias de férias.

Considerações Finais

O modelo aqui exposto faria que equipes das séries A, B e C nacional tivessem férias e pré-temporada de maior duração. Equipes de séries A e B jogariam de 12 a 15 partidas a menos por ano em média. As séries C e D nacional teriam mais jogos. A série D teria mais participantes, gerando assim mais empregos e calendário anual para 24 clubes a mais que os atuais 40.

Seria criada a série E Nacional, onde todos os clubes do país estariam em alguma divisão nacional. A principal regra para reduzir o tempo de desemprego de muitos profissionais e o tempo de inatividade do departamento de futebol da maior parte dos clubes é que a série E teria que ter duração mínima de 5 meses, mais um de pré-temporada. Por consequência desincharíamos o calendário dos grandes clubes, já que com o novo modelo de estaduais estes seriam jogados por equipes que se classificassem para tais anualmente.

Os novos estaduais seriam enxutos com duração máxima de apenas um mês e teriam maior importância, já que seriam o principal passaporte para a Copa do Brasil e composto só pelos melhores do ano em seu estado. A Copa do Brasil por sua vez possuiria menos clubes e também contribuiria para a redução do número de jogos dos grandes clubes. Fora isso a Copa do Brasil daria vaga, não só para a Libertadores da América, mas também para a Super Copa do Brasil que retornaria ao calendário nacional com a ideia de ser o nosso Super Bowl a ser vendido em diversos países com ou sem tradição no futebol.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Ludopédio.
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Marcelo Kaster Belletti

Especialista em Treinamento em Futebol pela Universidade Federal de Viçosa-MG

Juliano Oliveira Pizarro

Doutor pelo Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Ciências Humanas da Universidade Federal de Santa Catarina com período de Doutorado Sanduíche na Universidade de Aveiro (Portugal) no Departamento de Ciências Sociais, Políticas e do Território, mestre em Ciência Política pelo Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade Federal de Pelotas, especialista em Treinamento Desportivo e em Gestão e Organização do Esporte pela Uniasselvi, graduado em Educação Física Licenciatura pelo Centro Universitário Claretiano e bacharel em Direito pela Universidade Federal de Pelotas. Faz parte da IUAES Sport Anthropology Commission, participa do grupo de trabalho Política, Mercado e Futebol da ANPOCS, pesquisador do SP3: Sports, Power and Public Policy research group of Aveiro University. Realizou cursos de Análise de Desempenho Técnico e Tático no futebol e futsal, trabalhando na área no Futsal Feminino. Realiza pesquisas nas áreas de esporte, cultura e tecnologia, com enfoque nas temáticas sobre governança global, soft power, decolonialidade latino-americana, economia política, futebol e gênero. CREF nº 031957-G/RS.

Como citar

BELLETTI, Marcelo Kaster; PIZARRO, Juliano Oliveira. Proposta de reformulação para o calendário nacional do futebol brasileiro. Ludopédio, São Paulo, v. 86, n. 14, 2016.
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