O presente artigo examina os usos e sentidos da categoria “futebol moderno”, tal como empregado por subgrupos e vanguardas de torcedores de clubes esportivos no Brasil. À luz do conceito de ideologia, desenvolvido por John B. Thompson, analisa-se uma série de discursos de lideranças de torcidas organizadas e de coletivos torcedores que se contrapõem às transformações econômicas, arquitetônicas e organizacionais em curso no futebol profissional contemporâneo. Por meio de nove entrevistas semiestruturadas, procura-se entender como o termo “contra futebol moderno”, originado na Europa dos anos 1970 e difundido como slogan por movimentos ultras europeus desde os anos 1990, vem sendo apropriado no Brasil durante a última década, em reação aos megaeventos esportivos realizados no país (2007-2016) e à construção de arenas multiuso, que suplantam o modelo de estádios públicos, vigente desde a segunda metade do século XX. A análise de discurso aqui realizada chega à conclusão de que, embora se trate de uma pauta unificadora importante para esse segmento de atores futebolísticos, envoltos em relações assimétricas de poder, a luta contra o “futebol moderno” comporta uma série de ambiguidades em suas narrativas, porquanto se configura mais reativa e circunstancial do que efetivamente propositiva e programática. Ao assestarem suas baterias contra a descaracterização da tradição futebolística, verifica-se uma ambivalência na valoração do passado, via de regra idealizado como autêntico, espontâneo e festivo, em contraposição a um presente em tudo comprometedor da “essência” e da “autenticidade” perdida com a nova configuração do futebol midiático e mercantilizado.