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Caio Vilela

Equipe Ludopédio 8 de abril de 2010

O fotógrafo Caio Vilela nos recebeu em sua casa para uma conversa muito interessante sobre as suas experiências culturais por conta de suas viagens para fotografar. Tendo viajado para 60 países esse paulistano tem muito o que contar. Nessa primeira parte da entrevista conta como se tornou um fotógrafo, dos fatos imprevistos que acontecem durante suas viagens e  de como fazer fotos sobre futebol. Caio lançou recentemente o livro Futebol sem fronteiras pela editora Panda Books e participou com inúmeras fotos na exposição Ora, Bolas! O futebol pelo mundo no Museu do Futebol. Para ver as fotos de Caio publicadas no Ludopédio acesse o perfil dele em nossa Comunidade Ludopédica.

 

Primeira parte


Formado em Geografia na USP, como você iniciou sua carreira de fotógrafo?

No final da faculdade, por volta de 1994, eu usava muito meus feriados para acampar com amigos. A gente tinha na Geografia o GEG (Grupo Excursionista da Geografia). Não era nada além do que um grupo de amigos que ficava tentando achar um destino novo no mapa de ecoturismo de São Paulo e do Brasil. Eu também trabalhava de guia de ecoturismo. Eu viajava muito por estes dois motivos. E aí um amigo, que era jornalista na Folha de São Paulo, falou: “preciso urgente apresentar você para o Turismo JT”. O editor era o Hélio Guimarães. E este amigo falou para o Hélio: “chama esse cara para uma reunião que ele tem conteúdo”. Na época o JT estava interessado em dar um destino novo de ecoturismo a cada 15 dias na contracapa do caderno de turismo. Esse cara me chamou lá para uma reunião, eu fui lá e falou: “olha, tudo bem que você não é jornalista, você é estudante. Só traz novidades para a gente”. Ele gostou de umas fotos que eu mandei e pediu para eu falar três lugares que ele nunca tinha ouvido falar. Ou que eu achava que conhecia e ninguém conhecia. Eu falei três que ele nunca tinha ouvido falar e fiz uma primeira matéria, que foi com foto e texto já assinado. Por isso eu tomei gosto. Embora o JT na época pagasse muito pouco, o lado bom era que na época o dólar estava 1 para 1. Então, com uma colaboração de R$300,00, eu tinha U$300 e já conseguia viajar legal. Visitar uma serra em Minas, um parque nacional no Paraná. A cada hora eu ficava procurando um lugar novo, trazendo conteúdo, alimentando o jornal e eles me pagavam essa grana. Na categoria de estudante, estava ótimo. Aí em 1996 eu juntei U$10.000. Mas não fazendo esse tipo de trabalho, e sim com outros bicos que eu fazia com fotografia: álbuns de formatura, por exemplo, algo que dava grana. Então, juntei U$10.000 no final de 1995. Em 1996, na baixa temporada, fui viajar por seis meses. Auto-pautado. Eu escolhendo lugares e pautas que me interessavam na Ásia e no Oriente Médio. Rodei esses seis meses por Ásia e Oriente Médio, e trouxe na época slides. Voltei no avião colocando os slides na moldurinha e cheguei no jornal com tudo editado, bonitinho. Tinha trocado o editor e ele falou: “não sei se a gente vai querer usar o material. Vende para revista, pois revista paga melhor. Esse material está bom, as fotos estão legais e por isso acho que você vai se dar melhor”. Aí eu fui bater na porta. Não conhecia ninguém nas revistas. Mas a primeira que eu publiquei foi a Quatro Rodas, com a “Estrada mais alta do mundo” no Himalaia indiano. E aí eu fui emplacando em revistas de arquitetura, na Superinteressante, na Claudia, e eram sempre matérias de viagem. E quando eu peguei a manha de trabalhar como repórter comecei a fazer pauta de tudo quanto é tema. Quando eu fiz meus primeiros livros, em 2004 e depois em 2007, eu já trabalhava como freelancer para a Editora Abril, jornais, comecei a fazer o site.


E como geógrafo?

Eu nunca exerci, nunca dei aula e o máximo que eu consegui ser geógrafo trabalhando foi quando eu levava grupos de ecoturismo para fazer um estudo do meio em parques nacionais. Eu fazia essas aulas em campo para a Escola Britânica, ali no Jardins, para o Santa Cruz e Vera Cruz. Essas escolas do bairro…

Caio Vilella
Caio Vilela fala sobre seu inicio de carreira como fotógrafo e suas experiencias com o futebol. Foto: Enrico Spaggiari.


Quantos países você visitou nestes anos como fotógrafo? Quais elementos e características o levam a visitar determinados lugares? Prefere documentar lugares mais remotos e menos turísticos?

Sim, mais remotos, menos turísticos. Nesses quinze anos de viagem para trabalhar com reportagem, visitei entre 55 e 60 países, dependendo do seu critério. Passei dois dias em Moscou, mas eu acho que não conheço a Rússia. Não vou falar para você que eu conheço a Rússia. Fui lá na praça tirar as fotos e tomei um café. Então, têm vários que entram nesta categoria. São 60 se você considerar a Rússia. Como não sou formado em Jornalismo e como entrei nisso mochileiro querendo virar repórter, eu sempre contei com esse diferencial que é trazer o que ninguém tem. Nisso consegui juntar bastante experiência diferente. Vi um campeonato de construir iglus em uma ilha perto do Ártico, no norte do Canadá. E outras festas dos esquimós. Foi uma matéria para a revista Terra, super comentada. Publiquei bastante nos “golden years” da revista Terra, depois ela mudou de editora, mudou de nome e não ficou tão legal. Fiz também no Iêmen e me meti no meio dos fundamentalistas islâmicos. Descobri uma escolinha de filho de militar na Antártida, dos argentinos. Fui fazer uma matéria lá para o caderno Mundo da Folha de São Paulo.

” Em cada viagem volto com uma nova pauta”.
Caio Vilela
Caio Vilela visitou mais de 50 países.
Caio Vilela
O espírito aventureiro o acompanha em suas viagens.

  
Estes casos você descobre antes ou depois de estar lá?

Bom, claro. Metade eu descubro de estar lá. Mas alguma coisa mobiliza a viagem. Às vezes eu vou para algum lugar para fazer a pauta e volto com dez pautas. Aliás, é a intenção de toda viagem. Porque assim que eu consigo que uma viagem pague a outra. E ainda sobra uma grana para por os leitinhos das crianças em dia (risos).


E a sua viagem…

É. E as minhas viagens…


Como é a sua preparação antes de visitar os lugares? Você estuda as características locais?

Claro, leio muito. Leio muito, mas não fico vendo detalhe. Porque eu acho que perde um pouco o tesão se você já chega lá e: “pô, aqui é o Taj Mahal, vamos aqui deste lado porque tem um muro…”. Já sei tudo e só vim aqui conferir. Acho que não é muito meu espírito de viagem. Meu espírito é saber o que me dá tesão no lugar, ir atrás dele preparado para encarar umas surpresas e apostar na hora em algum assunto. E sempre com tempo livre. Tempo para tirar um tema do roteiro e priorizar outro. Isso eu faço muito em viagem e sempre dá certo. Só mantenho a antena ligada e a atenção no que interessa para mim e também para as revistas.


Qual é o equipamento fotográfico que você utiliza e quais são os critérios para escolhê-los?

É um equipamento semi-profissional: Sony e a outra câmera chama Lumix GH1. Formato da Lumix que é um casamento de tecnologia óptica laica com eletrônica Panasonic. É uma câmera que nas revistas de fotografia é o futuro da fotografia. É tudo o que as outras semi-profissionais são, só que é muito mais leve e discreta. Minha prioridade para escolher equipamento é que ele seja discreto, completamente silencioso e leve. Estas são as três primeiras prioridades. Viajar leve é a prioridade da minha vida, desde sempre. É claro, uma coisa que eu aprendo com o tempo. Já carreguei muitos trambolhos e mochila pesada. Hoje tento viajar com bagagem de mão, mesmo viagem comprida. Então, o equipamento precisa ser resumido, se não vira um trampo ficar carregando.


Este conjunto fotográfico pode variar de acordo com a localidade ou são sempre os mesmos instrumentos?

São sempre os mesmos. Junto com as câmeras eu levo um equipamento que me deixa ser mais versátil na hora de fazer as fotografias. Um tripé, um rebatedor, dois flashes, um fio para esticar o flash e bater em outro lugar, uma lanterna forte… Às vezes está muito sol na cara do cara, eu ponho a lanterna e suavizo a lente. Uns truques para tentar improvisar um truque de estúdio em campo. É um peso a mais, mas não dá para não levar. Se não, também, vira um amador. O equipamento já é amador para ser leve.


Mas já aconteceu de alguma vez nessas viagens você ir com uma câmera só e ela dar problema?

Eu sempre levo duas. A Sony é muito boa de guerra, vou te mostrar. Ela sozinha já resolve. A outra é nova, estou tentando fazer umas fotos boas com ela. Ma a Sony é a que não dá erro. Ela é ideal porque chegou na hora de fotografar um templo budista, um lugar silencioso, a mesquita no Irã, você não vai ficar lá clicando e fazendo barulho. Com ela, você bate todas as fotos e ninguém percebeu. Ela é super 007. E também muitas vezes eu fotografo para fazer making of de documentário. Então não posso ficar fazendo barulho do áudio de quem está filmando. Não conheço outra câmera que faça isso. Acho muito interessante que as “top de linha”, como a Canon e a Nikon, não tenham uma opção de não fazer barulho.

Caio Vilella
Caio Vilela da dicas de fotos de futebol e quais ângulos mais propícios para o clique. Foto: Enrico Spaggiari.


Em nosso site temos uma seção chamada Futebol-Arte, que tem como objetivo divulgar fotos sobre futebol, com fotos tanto de amadores quanto fotógrafos profissionais como você. Quais dicas você poderia dar aos fotógrafos iniciantes interessados no tema futebol?

Entrar no jogo e procurar ângulos diferentes. Porque a tendência é pegar o jogo de frente, ficar meio fora do campo. Já fiz muito isso. Mas você tem que começar a inventar uma hora. Colocar a câmera no chão, pegar a bola de perto, no ar, quanto mais movimento melhor. Em geral, bola alta e briga pela bola sempre rende boas fotos.


Fotos mais plásticas…

Bola alta, os caras brigando, cara no chão, poeira levantando… Eu acho que é aí. Foto de futebol é movimento. Muitas vezes você vê os caras parados, pois tem um jogando e outros estão esperando a bola aparecer no pé deles. É difícil pegar gente em movimento, todo mundo correndo…


Confira a segunda parte da entrevista no dia 23 de abril.

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